Trabalhando no Canadá

Uma das perguntas frequentes aqui no Blog é sobre o ambiente de trabalho no Canadá. Como ele se compara ao Brasil? Bom, vou tentar falar sobre isso  sob a ótica das minhas experiências de trabalho tanto no Brasil quanto no Canada Québec.

Primeiramente, quero pedir o perdão para generalizar e fazer uma definição meio simplista dos tipos de empresas que encontramos por aqui: Empresas Québécoises e Empresas Multiculturais. A primeira é fácil definir, empresas que nasceram aqui, onde a imensa maioria de funcionários é de Québécois. Nestas empresas todo mundo fala Francês, tem poucos imigrantes trabalhando, os poucos que tem são os exóticos da parada. As empresas Multiculturais normalmente são empresas multinacionais ou empresas que foram fundadas em outras províncias. Normalmente tem muito imigrante trabalhando, fala-se Inglês no dia-a-dia. São empresas onde o normal é ser diferente e, todo mundo convive bem (tá, nem sempre) com as diferenças.

Por que eu falei sobre os tipos de empresa? Porque a depender de onde você for trabalhar, a experiência vai ser bem diferente.

Então, se você me perguntar onde é o melhor lugar para trabalhar eu respondo, sem pensar duas vezes, qualquer empresa que tenha muito imigrante. E que Inglês seja o idioma principal de comunicação nesta empresa. Claro, isso é a minha opinião pessoal, ok?

Salário e Benefícios

Uma coisa que aqui é bem diferente do Brasil é conversar sobre salário. Em geral a regra é: ninguém conversa sobre salário, sobre aumento, nada que envolva dinheiro.

No Brasil era comum eu saber quanto meus colegas ou meu chefe ganhavam. Aqui não, por vários motivos. Quando você é contratado, o salário é uma negociação entre você e o seu chefe. Normalmente as empresas tem faixas salariais para cada nível de empregado, então é possível que você entre ganhando o mínimo desta faixa ou  o máximo. O seu colega de trabalho, que já está na equipe há muito mais tempo pode estar ganhando menos que você, que está acabando de entrar na empresa.

Algumas empresas também são flexíveis com relação a alguns benefícios, como por exemplo as férias. É possível que na sua negociação ao receber a oferta de trabalho você consiga ganhar uma semana de férias a mais do que normalmente é oferecido para todo mundo. Imagina o seu colega sabendo que você tem mais privilégios do que ele? Aumento de salário, bonus, também não são discutidos. E, pra ser sincero, eu acho que é bem melhor assim já que isso evita um monte de problemas que podem interferir no que é mais importante: no trabalho.

Pagamentos são feitos ou a cada duas semanas ou duas vezes por mês (geralmente dia 15 e dia 30/31). O calculo é o seguinte: seu salário anual dividido pelo numero de pagamentos. Exemplo: se você ganha $100 mil por ano, no esquema de pagamento a cada duas semanas você receberia $3846.15 ($100k/26) e no esquema de dois pagamentos por mês seria: $4166.66 ($100k/24).

Não existe 13 salário. Ah, mas no Brasil a gente ganha 13 salário! Bom, se você acha que 13 salário é um benefício eu lamento informar… que você foi enganado a vida toda e não sabe. 13 salário nada mais é do que uma compensação pelo trabalho que você fez mas que não foi remunerado. Não existem meses que tem mais de 4 semanas?

Férias, isso sim é bem diferente do Brasil. No Brasil, as férias são contadas em dias corridos. Aqui são em dias úteis. Então, quando se fala que tem 3 semanas de férias. na verdade quer dizer que você tem 15 dias úteis de férias. Não entra na contagem feriados e fins de semana. Ah, e não tem adicional de 1/3 de férias :/ Normalmente as empresas dão 2 semanas de férias. Outras dão 3, outras melhores dão 4, outras melhores ainda dão 5. E, normalmente não se tira tudo de vez. É normal tirar no máximo duas semanas de vez e o resto quebrado durante o ano.

Outros benefícios importantes são: seguro complementar de saúde, seguro dentário, seguro de vida, contribuição para aposentadoria, ações, bonus, auxilio transporte e por aí vai.

Amizades e vida social

Dificilmente os seus colegas de trabalho vão ser seus amigos. Claro que existem exceções à regra. E claro que isso também vai variar de acordo com a sua definição de amigo. Mas de um modo em geral é isso. Todo mundo é muito na sua.

Brasileiro adora uma festinha né? É aniversário de alguém? Para tudo e compra bolo, doces, salgadinhos e refrigerante! Aqui, no máximo você vai receber um cartão assinado por todos os seus colegas de equipe e um aperto de mão da pessoa que te entregar o cartão.

Almoço em restaurante com a galera toda semana, todo mês? Raro. Acontece as vezes, mas normalmente é quando alguém está se despedindo da equipe. O normal é todo mundo se encontrar na cafeteria / refeitório para almoçar. Sim, aqui todo mundo traz o seu almoço. Quando a temperatura permite, é comum algumas pessoas levarem seus almoços para comer numa praça, na grama, na porta da igreja, em qualquer lugar fora do escritório.

Normalmente as empresas fazem uma festa de confraternização no final do ano, onde, geralmente, a presença de todo mundo é esperada. Pessoas que nunca se sociabilizam não são muito bem vistas na equipe/empresa.

Horários

Normalmente os horários são flexíveis, isto é, você pode entrar na hora que quiser contanto que cumpra as 8 horas de trabalho diárias. Não tem isso de bater ponto, aqui  você é avaliado por produtividade. Algumas empresas permitem que você trabalhe de casa também. Filho ta doente? Uma puta nevasca la fora? Frio de -40? Sem problema, trabalha de casa!

Uma pergunta que sempre me fazem é se o ritmo aqui é mais puxado que no Brasil. Eu digo que na maioria das vezes é menos puxado. Só o fato de não ter que ficar batendo ponto como se fosse um prisioneiro em condicional já te dá uma certa tranquilidade. Além disso, as atividades são planejadas com antecedência e sempre tem tempo suficiente para executar tudo que é necessário. Hora extra faço quando realmente precisa, sem problema. Faz parte!

Falando sobre hora extra, algumas empresas pagam outras dão banco de horas outras simplesmente não pagam. O valor da hora extra normalmente corresponde ao valor de 1.5 horas de trabalho normal. Exemplo: Se você ganha $10 por hora, por uma hora extra trabalhada você ganharia $15.

Demissões

Uma vez contratado, dificilmente você vai ser demitido. Se isto acontecer é por que ou você é muito incompetente ou você não tem “soft skills” ou seu comportamento não é compatível com o das demais pessoas da equipe. Eu já vi gente ser demitida pelos dois motivos e as vezes a coisa pode ser bem “nasty”. Por exemplo, uma das demissões que eu presenciei aconteceu da seguinte maneira: o cara chegou pra trabalhar, logo em seguida alguém do RH o chamou para conversar. Alguns minutos depois ele foi cordialmente escoltado pra fora da empresa, sem ao menos pegar seus pertences. Todo os itens pessoais dele foram encaixotados e foi agendado um dia para ele ir pegar na recepção. Outras vezes a coisa foi menos severa, a pessoa pode pelo menos encaixotar tudo, resolver algumas ultimas pendências e ir embora.

Infra-estrutura / equipamentos

Como trabalho na área de TI, tenho que falar sobre o parque tecnológico das empresas. Nada de software pirata, nada de usar computador comprado na loja da esquina. Nada de pegar o computador que está encostado num canto e fazer dele um servidor de produção. Pelo menos até onde trabalhei até agora, tudo de primeira, hacks e mais hacks de servidores, ambientes de teste virtuais, rede de alta performance, telefonia voip. Tudo bem controlado, auditado, tudo bem profissional. Também não tem essa de ficar bloqueando sites com a desculpa de promover a produtividade dos funcionários, pratica comum no Brasil.

Outras coisas daqui

Toda empresa tem um cabideiro para você pendurar o seu casaco de inverno e um lugar para você deixar as suas botas. No inverno, todo mundo deixa um par de sapatos no trabalho pra usar enquanto estiver dentro da empresa.

Normalmente você ganha uma caneca pra não ficar usando copos descartáveis.

Normalmente tem café gratuito nas empresas. Onde eu trabalho atualmente tem café, café espresso, leite de todos os tipos, vários tipos de chá e uma máquina de coca-cola. Tudo isso gratuito.

E quando você aparece tomando um café diferente todo mundo pergunta: O café da empresa não é bom? É, mas eu enjoei!

Pausa para ir ao banheiro é “bio brake“.

Conversinha no meio do corredor é “chitchatting”.

Conversar sobre meteorologia é igual falar de futebol no Brasil.

Ser perguntado porque você deixou o calor, a praia e as bundas pra trás e resolveu morar no polo norte também é frequente.

Ser recebido com um sonoro ¡Hola! também.

 

Então é isso pessoal, vou ficando por aqui. Se tiver mais alguma coisa que queiram saber deixem um comentário (que eu respondo quando puder). E se eu lembrar de alguma coisa eu atualizo aqui.

Todo projeto tem começo, meio e… milestones

Pelo menos é assim que encaro o meu projeto de imigração. Prefiro achar que não tem fim, mas sim vários milestones importantes. Primeiro milestone é conseguir o visto, depois, outro milestone importante é chegar no Canadá. Em seguida, conseguir um emprego. Depois, conseguir um emprego melhor e assim por diante.

É sempre importante ter milestones bem definidos, olhar sempre à frente na medida que os milestones vão sendo alcançados.

Hoje quero falar de um dos mais importantes milestones no projeto de imigração: a obtenção da nacionalidade.

Já não é notícia nova, me tornei cidadão Canadense em Abril deste ano (2014). Um importantíssimo passo dado!

Citizenship Ceremony

Citizenship Ceremony

O processo de cidadania foi até tranquilo: envio de documentos, prova de cidadania (100% de acerto), entrevista e cerimonia de cidadania. Tudo isso demorou cerca de um ano e meio (atualmente tem demorado bem menos) e ao final, a sensação foi de dever cumprido.

Ter me tornado Canadense não mudou muito o meu dia-a-dia, a minha rotina. Na prática, o que mudou foi: ir para os Estados Unidos nunca foi tão fácil. A diferença no tratamento quando se entra com um passaporte Canadense é perceptível. Infelizmente, ainda não pude votar. Recebi a minha cidadania uma semana depois das eleições provinciais. É certo que o meu voto não ia fazer diferença no meu distrito eleitoral, que tem tradição de quase 50 anos de voto Liberal, mas eu queria fazer a minha parte como cidadão, botar pra fora o Parti Québecois.

A impressão que eu tenho é que esta nova condição de cidadão Canadense me dá um certo “empowerment“. Parece que você deixa de ser o imigrante, um ser de outra categoria, um “cidadão” muitas vezes considerado de segunda classe e passa a “jogar” de igual pra igual com todo mundo. Você rompe uma certa barreira e não aceita mais ser subjugado por motivo algum: por ser imigrante, por ser sul americano, por ser federalista (morando no Québec) ou por qualquer outro motivo. A única coisa que eu penso é “fuck off“.

Fuck off” porque ralo pra caralho muito todo dia, pago imposto pra caralho muito imposto nesta província, muito mais até do que muitos canadenses nativos. É o nosso trabalho que está ajudando esta província (e este país) a progredir. E é nosso dever contribuir para que esta província (e este país) seja moldado também sob as nossas perspectivas.

Continuo sendo Brasileiro e torcendo para que o Brasil dê muito certo. Mas é inegável que as cores branca e vermelha são cada vez mais as minhas cores do coração. Sinto me cada vez mais Canadense e torço também para que tudo continue dando certo aqui na minha nova pátria.

Eu era o maior embaixador do Québec

… mas não dá mais.

Desde que o Parti Québecois (separatista, extremista) ganhou as eleições provinciais ano passado, um clima de tensão se instaurou no Québec, principalmente em Montréal que é onde tem a maior parcela de imigrantes.

Para este partido e para todos que seguem a mesma ideologia, o Québec é para os Québécois. Quando eu digo Québécois eu estou me referindo aos de origem francesa. Todo o resto é cidadão de segunda categoria: Nascido aqui, mas anglo-canadense; nascido aqui, mas filho de imigrante; imigrante…

Eles tem ódio mortal de anglo canadenses pois “foram oprimidos pelos imperialistas britânicos”. Eles não gostam de imigrantes pois, segundo eles, os imigrantes foram os culpados pela derrota do Parti Québecois no último referendo para que o Québec pudesse se separar do Canadá.

Eles estão mostrando a cara deles: que é de intolerância e racismo. Nunca pensei que fosse encontrar isso no Canadá. Mas estamos falando do Québec… aquele Québec que ninguém falou pra você que existia e que me parece tão diferente do resto do Canadá.

O Québec deste partido:

  • Não tolera (pra não dizer Condena) quem não fala francês;
  • Não tolera outras religiões (judaísmo, islamismo, a religião sikh, etc);
  • Só tem uma agenda: Separatismo e incitar a população contra quem é diferente.

A coisa tá tão ruim que tem muita gente abandonado o barco. Veja esta reportagem da CTV sobre o assunto: http://montreal.ctvnews.ca/moving-on-why-quebecers-are-saying-adieu-1.1519952

E não há um dia sequer que eu não pense em tomar a mesma decisão. Minha esperança é que a paz volte a reinar. Adoro Montréal, acho que no Canadá não há lugar melhor pra morar. Mas do jeito que tá…

 

O Inverno acabou

E com ele o meu jejum de posts aqui no blog, assim espero.

2012 foi um ano de muitas mudanças na minha vida, mudanças boas diga-se de passagem.

Um divisor de águas

Esqueça tudo o que você viveu até hoje. Formatura do colegial, primeira namorada, primeira noite de amor, graduação, casamento, imigração, nada disso muda sua vida. Acredite em mim. O que muda é a paternidade / maternidade. Quem é pai ou mãe vai concordar comigo.

Sua rotina muda, seu sono muda, suas preocupações mudam, o jeito de pensar / planejar o futuro muda, o jeito de ver as coisas mudam, seus sentimentos mudam. Muda até o jeito como você olha pra seus pais, se colocando no lugar deles e vendo o que eles fizeram por você e como você vai fazer pelo seu filho.

Estou agora descobrindo como é ser pai imigrante no Canadá, em especial no Québec. Ainda está cedo para escrever algo sobre o assunto, mas assim que tiver mais “experiência” irei fazer alguns comentários.

Trabalho, trabalho, trabalho!

Achei pouco ter virado pai, pra ter mais emoção decidi também mudar de emprego. Já não estava tão satisfeito com o meu antigo emprego, o projeto já não estava tão interessante assim, comecei a ficar com a impressão de que estava ficando estagnado e, para piorar as coisas, o salário não estava aumentando num ritmo que conseguisse manter-me empolgado.

Por outro lado, o mercado estava cheio de propostas interessantes e consegui encontrar uma oportunidade que fosse boa em todos os sentidos: financeiramente, progressão de carreira, desafios, projetos interessantes, etc. Posso dizer que agora cheguei onde queria chegar.

Tenho trabalhado mais, mas tenho me sentido mais realizado. Tenho aprendido muito neste novo emprego e tenho trabalhado com pessoas brilhantes. Isso faz toda a diferença.

Então é isso, um pequeno resumo do que aconteceu nestes últimos 8 meses. Agora vocês sabem o porque de eu não ter publicado nada aqui no blog.

Aos poucos vou voltar a escrever, falarei menos sobre processo de imigração e mais de coisas que acontecem aqui no Canadá, coisas do dia-a-dia.

Até a próxima.

Quase nunca tenho pesadelos

Mas quando tenho, é sempre o mesmo: Por algum motivo qualquer eu tive que voltar pro Brasil. Voltei a morar em Brasília, voltei a trabalhar no meu antigo emprego, deixei pra trás tudo o que tenho aqui. Inexplicavelmente, esta ida ao Brasil é temporária, é por um ano ou dois, mas nestes sonhos (pesadelos) parece que o tempo não passa e eu vou ficando preso e não consigo voltar.

Felizmente, ao acordar, vejo que continuo aqui no Canadá. Agradeço a Deus por estar aqui ainda e por tudo o que tenho conseguido ao longo destes quase 4 anos.

Mas de verdade, estes pesadelos me intrigam. Acho que deve ter alguma coisa a ver com todo o stress que foi esperar pelo processo. Morei 4 anos em Brasília e durante boa parte deste tempo o processo de imigração fez parte da minha vida. Em 4 anos, parece que nada ia pra frente, meus planos eram limitados, foram 4 anos de vida “regrada”, de rotina de trabalho, estudos, casa, sem muita diversão. Dias angustiantes, de espera, sem clímax.

Ainda bem que isso já passou, espero que acabem também os pesadelos.